Em razão do Dia Mundial do Migrante e do Refugiado, o Superior Geral da Congregação dos Missionários de São Carlos, Padre Leonir Chiarello deixou uma mensagem para toda a família scalabriniana e também convida a todos a participar na semana que antecede a canonização, para um tríduo de oração em preparação a esse evento. Acesse aqui e veja uma sugestão de texto para utilizarem como base na reflexão do tríduo.
Leia abaixo a mensagem:
A intuição dos fatos futuros
Caros irmãos,
O Dia Mundial do Migrante e do Refugiado celebra-se alguns dias antes da canonização do Bem Aventurado João Batista Scalabrini. Por um tempo, tínhamos a ideia de que os dois eventos iriam coincidir. Teria sido uma ocasião perfeita para apontar para a Igreja e para o mundo o pensamento e a ação daquele que viu, cuidou e acompanhou os migrantes e que fez da migração um fenômeno e um sinal dos tempos para compreender as transformações da história e o plano de salvação de Deus. Mesmo que os dois eventos não coincidam, não podemos deixar passar esta ocasião sem uma reflexão que nos é proposta pelo Papa Francisco e que nos ajuda a nos preparar com nossos irmãos e irmãs migrantes para a grande celebração do dia 9 de outubro.
Construir o futuro com migrantes e refugiados é o tema escolhido pelo papa este ano. Em sua mensagem, o papa olha para o futuro em termos escatológicos, como plenitude do Reino, mas ele nos lembra imediatamente que o Reino já está em nosso meio e, portanto, já devemos estar abertos a acolhê-lo e comprometidos com a sua construção. Como a justiça habita no Reino, os migrantes são chamados a fazer parte do mesmo projeto. Se eles fossem excluídos, não seria o Reino de Deus. Mas também é necessário que eles participem ativamente, contribuindo para sua construção com a beleza e originalidade de sua presença, enriquecendo a Jerusalém dos povos.
A perspectiva de Francisco é muito diferente e claramente divergente da visão e política muitos governantes ou mesmo de pessoas comuns, que vêem nos migrantes uma ameaça a se proteger, uma invasão de exploradores que chegam para “disputar e roubar” os recursos e oportunidades disponíveis. A questão de como acolher os migrantes e torná-los parte da sociedade de destino tem sido objeto de infinitos debates e diferentes modelos, também articulados de acordo com o tipo de imigração. Há Estados que não favorecem a integração permanente dos migrantes para não ter que lidar com a questão da coexistência e convivência civil e, portanto, a possibilidade de uma mudança no substrato (identidade) cultural do país. Há Estados que visam a rápida absorção e inculturação dos imigrantes, basicamente com o mesmo objetivo de não enfrentar-se com a tradição cultural de cada povo. É um modelo que tende a fazer com que os migrantes se tornem como nós, a fim de evitar que nos tornemos como eles. Existem meios intermediários, que geralmente se enquadram no termo integração, entendida como um processo no qual todos perdem e ganham algo. Entretanto, a implementação prática da integração muitas vezes permanece inadequada e controversa. Sem aprofundar nas muitas nuances do discurso, é útil lembrar que os migrantes não podem compartilhar o passado do país em que chegam. Eles vêm de outro passado, ricos em diferentes memórias. Mas quando se inserem em outro país, devem respeitar esse passado e, sobretudo, acolher e respeitar a síntese que esse país fez e que geralmente é chamada de carta constitucional e se expressa na constituição nacional. No entanto, em sua escolha migratória, os migrantes dizem que decidiram compartilhar o futuro daquele país. Esta escolha deve ser levada a sério e os migrantes devem ter a oportunidade de contribuir para o futuro com a originalidade de suas perspectivas, a riqueza de suas diferenças culturais e habilidades profissionais. Muitas discussões e decisões políticas erradas sobre migração decorrem de uma falta de perspectiva, do fato de fixar exageradamente o olhar na diversidade própria de cada povo em base ao passado em suas diferentes origens e muito pouco se olha para o futuro que tem horizontes comuns os quais orientam nosso caminho.
As dinâmicas dentro de cada um de nós são diferentes, mas elas também têm semelhanças. Ao abraçar o carisma da congregação scalabriniana, também abraçamos seu passado, que somos convidados a conhecer, pois é através desse passado que o carisma foi transmitido, enriquecido e chegou até nós. Acima de tudo, abraçamos o passado até as origens, até o Fundador, porque sua vida, seu pensamento, sua santidade são decisivos para nossa escolha fundamental e para o ideal que queremos realizar. Mesmo entre nós, no entanto, podem surgir dificuldades e obstáculos que atrasam a viagem, e estas são dificuldades que surgem porque mantemos um olhar pequeno e reduzido, muito focado no passado, de onde viemos, em vez de deixar-nos guiar e deixarmos levar pela força do futuro, lugar que estamos construindo e direção para onde estamos indo.
A canonização de Scalabrini deve ser também uma oportunidade para compartilhar sua profecia e sabedoria, sua "intuição de eventos futuros". No grande movimento de transformação da sociedade de seu tempo, Scalabrini intuiu que a emigração não era uma anomalia, muito menos um problema, mas um componente estrutural fecundo para o nascimento de novas formas de convivência, encontro e coexistência. Para ele, os migrantes não eram apenas os pobres deserdados, necessitados de ajuda e proteção, mas eram sobretudo, também sujeitos socio-políticos e eclesiais capazes de contribuir para o desenvolvimento e o progresso. Acima de tudo, Scalabrini teve um olhar especial para o futuro fecundo e importante, no qual, o Reino estava se realizando, viu e sentiu também que, graças à migração, uma obra muito maior estava sendo gestada e realizada, "o aperfeiçoamento do ser humano na terra e a glória de Deus no céu".
A convite do Papa Francisco, mas ainda mais a exemplo de Scalabrini, tenhamos nosso olhar focado para o futuro cheios de confiança. Sejamos protagonistas do futuro que nos chama a dar nossa contribuição específica para a construção do Reino, façamo-lo com os migrantes que continuamente nos abrem novos caminhos, façamo-lo com os espírito de Scalabrini, que nos pede para aspirarmos constantemente à santidade.
P. Leonir Chiarello, cs
Superior Geral