O Carisma é um dom gratuito do Espírito Santo, concedido a determinadas pessoas “para que, por meio delas, sejam úteis à Igreja na renovação e expansão dela” (Catecismo da Igreja Católica, n. 799). Trata-se de uma graça particular, dada não para a santificação individual, mas para o bem comum e o serviço da comunidade eclesial: “Os carismas devem ser acolhidos com gratidão tanto pelos que os recebem como por todos os membros da Igreja” (CIC, n. 800). São dons diversos, simples ou extraordinários, mas sempre voltados à edificação da Igreja e à realização de sua missão.

Como recorda o Concílio Vaticano II: “Estes Carismas, extraordinários ou simples e comuns, devem ser recebidos com gratidão e consolo, porque são convenientemente adaptados e úteis às necessidades da Igreja” (Lumen Gentium, n. 12). Na mesma linha, São João Paulo II, na Exortação Apostólica Christifideles Laici, afirma que “os Carismas, quer extraordinários, quer simples e humildes, são graças do Espírito Santo que têm, direta ou indiretamente, uma utilidade eclesial: são ordenados à edificação da Igreja, ao bem dos homens e às necessidades do mundo” (n. 24).

Portanto, o Carisma é um dom pertencente à Igreja – compreendida como instrumento e sacramento de salvação – e é confiado a pessoas, grupos e comunidades para a edificação do Corpo de Cristo e serviço ao povo de Deus. Trata-se de uma manifestação concreta da ação do Espírito Santo na história, adaptada às necessidades espirituais e sociais de cada tempo. A Congregação para a Doutrina da Fé, em Iuvenescit Ecclesia (2016), destaca que os Carismas “não podem ser compreendidos de modo individualista, mas sim no interior da comunhão e da missão da Igreja” (n. 15).

Um Carisma nascido do olhar compassivo de um pastor

Foi nesse contexto que Dom João Batista Scalabrini, tocado pela realidade dos migrantes na estação ferroviária de Milão, no final do século XIX, acolheu um chamado específico: ser sinal do amor providente de Deus junto aos homens e mulheres obrigados a deixar sua terra natal em busca de dignidade.

Ao fundar a Congregação dos Missionários de São Carlos, Dom Scalabrini assumiu um Carisma profundamente eclesial: o cuidado pastoral, espiritual, humano e social dos migrantes. Inspirado por esse dom, ele compreendeu que a Igreja deveria ser mãe e mestra, particularmente próxima daqueles que vivem na condição de mobilidade, vulnerabilidade e desamparo.

Embora pertença à Igreja, esse Carisma foi assumido e encarnado com originalidade e dedicação pela Família Scalabriniana, formada por sacerdotes, religiosas, consagradas, leigos e leigas, unidos no mesmo chamado: acolher, proteger, promover e integrar os migrantes, refugiados e itinerantes, com amor evangélico e competência missionária.

Serviço como identidade: uma missão que se renova no tempo

O Carisma Scalabriniano é, portanto, uma forma concreta de participação na missão da Igreja, caracterizada por um serviço carinhoso, fraterno e profético junto àqueles que se encontram em deslocamento. Ele se expressa como um bálsamo para as feridas causadas pela migração, pelo desenraizamento, pela solidão e pelas injustiças.

Desde suas origens, a Congregação compreendeu que esse serviço exige uma resposta sempre atualizada. O olhar de Dom Scalabrini, que reconheceu o drama dos migrantes italianos em um momento específico da história, tornou-se uma intuição profética que se expandiu com o tempo. Hoje, as “estações” se multiplicaram: são portos, fronteiras, campos de refugiados, periferias urbanas e ambientes digitais, onde o fenômeno da mobilidade humana continua a clamar por presença e cuidado. O Carisma permanece intacto, mas sua vivência requer constante discernimento e criatividade missionária.

Inicialmente voltado para os migrantes italianos nas Américas, o Carisma Scalabriniano logo se expandiu para todos os migrantes italianos no mundo. Posteriormente, passou a incluir seus descendentes e, com o tempo, todos os migrantes, independentemente de nacionalidade, etnia ou religião.

Esse movimento de abertura também alcançou a composição interna da Congregação, que deixou de ser exclusivamente italiana para se tornar um mosaico de vocações vindas de diversas culturas e nações. Essa internacionalidade enriquece a missão e testemunha a universalidade da Igreja.