
Em cada coração humano, Deus semeou um desejo profundo: o de amar e ser amado, o de entregar-se por algo maior do que si mesmo. Esse desejo não é uma ilusão, mas o eco de um chamado real, feito por Aquele que nos criou por amor e para o amor. É isso que a Igreja chama de vocação: um chamado divino, pessoal e intransferível, que nos convida a corresponder, com generosidade, à vontade de Deus para nossa vida.
Mas, afinal, o que é vocação? Como descobri-la? E quais são os caminhos possíveis para quem quer seguir com fidelidade os passos de Cristo?
Vocação: um chamado de amor
A palavra “vocação” vem do latim vocare, que significa “chamar”. Não é algo que escolhemos sozinhos, mas uma iniciativa de Deus, que nos precede e nos interpela. Como ensina o Catecismo da Igreja Católica:
“Toda a Igreja é apostólica, na medida em que, através dos sucessores de Pedro e dos Apóstolos, permanece em comunhão de fé e de vida com a sua origem. Toda a Igreja é apostólica, na medida em que é ‘enviada’ a todo o mundo. Todos os membros da Igreja, embora de modos diversos, participam deste envio. ‘A vocação cristã é também, por natureza, vocação para o apostolado’. E chamamos ‘apostolado’ a ‘toda a atividade do Corpo Místico’ tendente a ‘alargar o Reino de Cristo à terra inteira.” (CIC 863)
Ela é sempre uma resposta de amor Àquele que nos amou primeiro (1Jo 4,19). Mais do que uma tarefa ou função, vocação é um modo de existir no mundo como sinal da presença de Deus.
Um só chamado, quatro caminhos
A Igreja reconhece que há muitas vocações, mas todas têm uma origem comum: o Batismo. É a partir dele que somos consagrados ao Senhor e chamados à santidade. No entanto, dentro dessa grande vocação batismal, há caminhos diversos, formas distintas de viver o seguimento de Cristo. Dentre elas, destacam-se quatro grandes vocações:
1 - Vocação ao Ministério Ordenado
É o chamado a ser, em meio ao povo de Deus, um sinal visível de Cristo Pastor, Mestre e Servo. O Ministro Ordenado (Diácono, Padre ou Bispo) é aquele que, configurado a Cristo pelo sacramento da Ordem, consagra o pão, perdoa os pecados, consola os aflitos e guia o rebanho.
Modelo inspirador: Bispo de Piacenza (Itália), Scalabrini foi um Sacerdote apaixonado pela Eucaristia, pela catequese e pelos pobres, mas principalmente pelos migrantes. Percebeu que milhões de pessoas eram forçadas a deixar suas terras e assumiu essa missão: levar Cristo aos que estavam longe da própria pátria, mas perto do coração de Deus. Fundou a Congregação dos Missionários de São Carlos para cuidar dos migrantes e testemunhou que sua vocação era amar sem fronteiras.
2 - Vocação Religiosa
Homens e mulheres que, movidos pelo Espírito, deixam tudo para seguir Jesus mais de perto. Pela vida consagrada, tornam-se sinal escatológico, ou seja, antecipação do Reino definitivo. Vivem os conselhos evangélicos — pobreza, castidade e obediência — como testemunho de que Deus basta.
Modelo inspirador: O Venerável Pe. José Marchetti foi um Missionário Scalabriniano que dedicou sua vida a servir os imigrantes no Brasil, seguindo o exemplo de São João Batista Scalabrini. Cofundador das Missionárias de São Carlos Borromeu – Scalabrinianas, ele fundou o Orfanato Cristóvão Colombo (hoje Instituto Cristóvão Colombo), oferecendo cuidado e esperança aos órfãos e crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade. Sua vida é um exemplo de entrega total, amor pastoral e compromisso com os necessitados, inspirando religiosos a viverem com fé e dedicação.
3 - Vocação Matrimonial
Chamado à santidade vivido no amor conjugal e na família. Marido e mulher tornam-se uma só carne, vivendo a fidelidade, a fecundidade e o dom de si, sendo sinal do amor de Cristo pela Igreja (cf. Ef 5,25-33).
Modelo inspirador: Pais de Santa Teresinha do Menino Jesus, São Luís e Santa Zélia foram canonizados juntos em 2015 — o primeiro casal na história da Igreja a ser elevado às honras dos altares como marido e mulher. Viviam uma fé profunda, trabalhavam com honestidade, cuidavam da família e transmitiam aos filhos os valores cristãos. Mesmo enfrentando o sofrimento — incluindo a morte de quatro dos nove filhos —, permaneceram firmes na confiança em Deus.
4 - Vocação Leiga
A vocação de santificar o mundo a partir de dentro, sendo luz e fermento no cotidiano. O leigo é chamado a anunciar Cristo no trabalho, na política, na cultura, na família — em todas as realidades da vida.
Modelo inspirador: Beato Carlo Acutis foi um jovem leigo que viveu sua fé com muita alegria e intensidade no século XXI. Apaixonado pela Eucaristia, pela catequese e pelo uso da tecnologia para evangelizar, ele mostrou que a santidade é possível na vida cotidiana, mesmo em tempos modernos. Com seu testemunho simples e autêntico, Carlo inspira jovens a viverem a fé no meio do mundo, com criatividade e amor.
Como discernir minha vocação?
Ouvir o chamado de Deus exige silêncio, escuta e coragem. Não se trata de buscar certezas imediatas, mas de caminhar com confiança. O discernimento vocacional é, muitas vezes, um processo lento, feito de oração, vivência comunitária, orientação espiritual e disposição para obedecer.
O Papa Francisco, na Exortação Apostólica Pós-Sinodal Christus Vivit, recorda que: “Uma expressão do discernimento é o esforço por reconhecer a própria vocação. Requer espaços de solidão e silêncio, porque se trata de uma decisão muito pessoal que mais ninguém pode tomar no nosso lugar”.
Alguns sinais que ajudam no discernimento:
A alegria interior ao pensar em determinado caminho;
A paz espiritual diante de uma escolha concreta;
A identificação com o estilo de vida daquele estado vocacional;
A confirmação da Igreja por meio de pessoas maduras na fé;
O desejo de entrega, de fazer da vida uma resposta de amor.
Um chamado que continua
O chamado de Deus não é um grito, mas um sussurro que se faz ouvir no íntimo da alma. Ele continua chamando hoje, como chamou ontem. E chama a cada um pelo nome. A vocação não é uma escolha entre opções boas ou ruins, mas a escolha de qual bem maior Deus sonhou para nós desde toda a eternidade.
No mês vocacional, os Missionários de São Carlos – Scalabrinianos recordam com esperança e alegria: Deus continua chamando! E convida cada jovem, assim como fez com Bartimeu dizendo: Coragem, Ele te chama! (Mc 10,49).
Texto: Vitor da Cruz Azevedo, Setor de Conteúdo do Departamento Regional de Comunicação.
Foto: Arquivo Regional da RNSMM.




