O Chamado Acontece no Meio da Tempestade

Na realidade do mundo contemporâneo, onde tudo é passageiro, o Ano da Esperança surge como um oásis de alento, uma oportunidade para recarregar as energias e seguir na caminhada de discernimento sobre aquilo que cada jovem pode fazer com a sua vida.

Ao falar de vocação, o Santo Padre escolhe a palavra gratidão como fio condutor de sua reflexão. Ele expressa seu reconhecimento aos Sacerdotes e o desejo de apoiar seu Ministério, estendendo esse olhar agradecido a todo o Povo de Deus. Para isso, inspira-se no Evangelho que narra a experiência singular vivida por Jesus e Pedro numa noite de tempestade no lago de Tiberíades (cf. Mt 14, 22-33).

Depois da multiplicação dos pães, que encantou a multidão, Jesus ordena aos discípulos que subam ao barco e sigam à sua frente para a outra margem, enquanto Ele despede o povo. A imagem desta travessia do lago sugere, de certa forma, a viagem da nossa existência. O barco da vida avança lentamente, constantemente à procura de um porto seguro, desafiando os riscos do mar, mas também desejoso de uma orientação segura por parte do timoneiro. Contudo, é possível perder-se, ser seduzido por falsas luzes ou ser vencido pelos ventos contrários das dificuldades, dúvidas e medos.

Assim também é no coração dos discípulos: chamados a seguir o Mestre de Nazaré, precisam decidir-se a atravessar para a outra margem, abandonando suas seguranças para seguir os passos do Senhor. Esta travessia, porém, não é tranquila. A noite cai, o vento sopra contra o barco, as ondas o sacodem — e o medo de falhar pode se sobrepor à confiança na vocação.

Mas o Evangelho nos assegura: não estamos sozinhos nessa travessia. Ainda no meio da noite, o Senhor caminha sobre as águas agitadas, vai ao encontro dos discípulos, chama Pedro a ir ao seu encontro sobre as ondas e o salva quando começa a afundar. Por fim, sobe ao barco e faz cessar o vento.

Por isso, a vocação é, antes de tudo, um chamado à gratidão. Navegar pela rota certa não depende apenas dos nossos esforços ou das decisões que tomamos sozinhos. A realização da nossa vida e dos nossos projetos não é um cálculo exato de vontades, mas uma resposta a um chamado que vem do Alto. É o Senhor quem nos mostra a direção, nos dá coragem para subir ao barco e, ao mesmo tempo em que chama, também se torna nosso timoneiro — orientando-nos, impedindo-nos de naufragar nas incertezas e tornando-nos capazes até de caminhar sobre as águas turbulentas.

Toda vocação nasce daquele olhar amoroso de Cristo, que nos alcança — muitas vezes quando estamos à deriva na tempestade. Mais que uma escolha nossa, a vocação é uma resposta a um chamado gratuito do Senhor (cf. Carta aos Presbíteros, 4.VIII.2019). Por isso, só conseguimos reconhecê-la e acolhê-la quando o coração se abre à gratidão e se dispõe a perceber a passagem de Deus em nossa vida.

Nós, como Religiosos, Missionários dos migrantes e Sacerdotes, experimentamos essa gratidão muitas vezes, especialmente na acolhida da nossa opção de vida. Mesmo com nossas fragilidades e misérias, a mão de Deus sempre se faz presente — e o barco não afunda. Isso nos mostra que o mais importante em um processo de discernimento vocacional é ter a coragem de ir. O resto, Aquele que chama, se encarregará de fazer acontecer.

Leia a mensagem do Papa Francisco para o 62º Dia Mundial de Oração pelas Vocações.


Texto: Pe. Adriano Pires, CS, Animador Vocacional da Congregação dos Missionários de São Carlos.

Foto: Adobe Stock.