Mensagem do Superior Geral para o 120º aniversário da morte de São João Batista Scalabrini

Prezados irmãos,

O dia 1º de junho de 2025 marca o centésimo vigésimo aniversário do nascimento ao céu de São João Batista Scalabrini, nosso Fundador. É um aniversário que enche nossos corações de gratidão e uma ocasião para recordar a vitalidade profética de sua visão e de seu compromisso pastoral e social, que nos chama de volta às raízes de nosso carisma e nos convida a relê-lo e implementá-lo à luz do presente, com um renovado compromisso específico, exemplar e significativo.

Um tempo de profecia e compromisso

São João Batista Scalabrini viveu em uma época de grandes mudanças políticas, sociais e eclesiais: na esfera política, as tensões do processo de unificação italiana; na esfera social, os efeitos socioeconômicos da revolução industrial e da globalização do mercado de trabalho, a questão operária e as migrações em massa; e na esfera eclesial, as tensões entre Estado e Igreja e o nascimento de vários institutos missionários.

Foi nesse contexto que sua voz profética se fez ouvir em forma clara e potente. Ele viu claramente que o Evangelho devia ser encarnado nas feridas da humanidade de seu tempo e que a Igreja não podia ficar alheia: "Onde está o povo que trabalha e sofre, aí está a Igreja” (Giovanni Battista Scalabrini, L'emigrazione italiana in America, Piacenza 1887, p. 50).

Sua voz profética se ergueu em diálogo e em sintonia com a do Papa Leão XIII, que em sua Encíclica Rerum Novarum (1891), a "pedra angular" da Doutrina Social da Igreja, abordou a questão social e dos trabalhadores diante da ascensão do socialismo, do marxismo e do capitalismo industrial desenfreado, denunciando a exploração dos trabalhadores e enfatizando a necessidade de promover a dignidade do trabalho, salários justos e a relação entre a propriedade privada e o bem comum.

A aceitação da Rerum Novarum por Scalabrini não foi apenas teórica, mas se traduziu em seu corajoso e concreto compromisso pastoral e social: ele apoiou sociedades de ajuda mútua, incentivou associações de trabalhadores católicos e promoveu ações educativas e de formação capazes de devolver a dignidade às populações mais pobres. "O problema social, antes dos livros, eu o aprendi com a visão de tantas feridas e misérias sociais, sobre as quais, por dívida sacrossanta, derramei o bálsamo da fé e a ajuda da caridade", escreveu ele em 1899.

E, diante do êxodo de milhões de italianos forçados a emigrar para as Américas, Scalabrini não ficou de braços cruzados. Com a mesma convicção da necessidade de uma resposta concreta da Igreja aos desafios enfrentados pelos migrantes, ele agiu com visão e espírito evangélico, fundando nossa Congregação em 1887 e antecipando o que o Papa Leão XIII escreveu um ano depois na Carta Encíclica Quam aerumnosa, na qual denunciou os perigos morais e materiais enfrentados pelos emigrantes nos países de destino. Ele foi o primeiro intérprete e realizador da mensagem do Pontífice, traduzindo-a em ações concretas de acompanhamento espiritual, social e político em favor dos migrantes.

Compromisso por uma “paz desarmante e desarmada”

Esse diálogo ideal continua até hoje com o Papa Leão XIV, que coloca no centro de seu pontificado a urgência de uma "paz desarmada e desarmante, humilde e perseverante". Tanto naquela época como agora, as migrações são causadas por conflitos armados, processos econômicos injustos, instabilidade política, catástrofes ambientais e modelos de desenvolvimento excludentes. Não se trata apenas de deslocamentos geográficos, mas de vidas humanas em busca de dignidade, justiça e um futuro. Nesse cenário, a missão scalabriniana é chamada a se renovar continuamente, permanecendo fiel à intuição do Fundador e atenta aos novos "sinais dos tempos", como nos recordamas Regras de Vida: "fiéis aos compromissos que ele nos transmitiu, e em consonância com as realidades contemporâneas, dedicamo-nos a todos os que, em conseqüência das migrações, por verdadeiras necessidades, exigem uma assistência pastoral específica. Portanto, tendo presente a vontade da Igreja, as intenções do Fundador e as vicissitudes de nossa Congregação, entre os destinatários de nossa missão, confirmamos a escolha preferencial para os migrantes que mais agudamente vivem o drama da migração. " (RdV 5).

Ao mesmo tempo, tendo em mente que o primeiro direito de um migrante é poder permanecer em sua terra natal, o que muitas vezes não lhe é garantido por políticas de desenvolvimento deficitárias ou inexistentes, desastres naturais e guerras, também somos convidados a trabalhar nos países de origem das migrações, como nos lembram nossas Regras de Vida: "Para que a história das migrações com suas vicissitudes possa dar origem a um mútuo enriquecimento humano e cristão, nossa missão, além de dirigir-se às comunidades de chegada, estende-se também àquelas de onde partem os imigrantes. " (RdV 25).

Nessa perspectiva, nossa missão não apenas nos compromete com o acolhimento, proteção, promoção e integração daqueles que já migraram, mas também com o diálogo e a coordenação com os Estados, organismos internacionais, setor privado, sindicatos, associações e organizações da Igreja para garantir uma governança capaz de enfrentar os desafios da migração, incluindo a coexistência pacífica e a fraternidade entre os povos.

Peregrinos da esperança

Em nosso último Capítulo Geral, definimos um projeto missionário que nos convida a caminhar na caridade como "peregrinos da esperança". É um convite para caminhar com aqueles que experimentam o desenraizamento, com aqueles que cruzam fronteiras visíveis e invisíveis. Os

migrantes, lembrou-nos o Papa Francisco, "são mestres de esperança": em suas histórias, feridas e coragem resiliente encontramos a tensão em direção a uma vida nova, em direção a uma terra prometida. Nós, como filhos espirituais de Scalabrini, queremos caminhar com eles, ouvindo, compartilhando e anunciando a esperança cristã. Uma esperança que nasce da Cruz e floresce na Ressurreição. Uma esperança que nos pede para reconhecer em cada rosto de migrante o próprio rosto de Cristo. Uma esperança que, em um tempo marcado por incertezas, medos, guerras e novas formas de pobreza, é encarnada em escolhas corajosas de proximidade, de escuta e de acompanhamento. Em meio aos desafios de nosso tempo, o Espírito Santo nos chama para sermos sinais visíveis da ternura de Deus ao longo das fronteiras do mundo.

Uma corresponsabilidade a ser renovada

Neste aniversário, sentimos um forte desejo e a responsabilidade de renovar nosso compromisso: como missionários, como Igreja, como comunidade que se abre à humanidade ferida e em colaboração com a família scalabriniana, consagrados e leigos, com as organizações eclesiais e sociais, com os governos e com as organizações internacionais. Estamos cientes de que a governança da migração não pode ser confiada a uma única instituição ou governo, mas requer uma colaboração concreta e responsável entre a Igreja, o Estado, as organizações sociais e as organizações internacionais. Scalabrini, com seu trabalho, foi um precursor disso: seu modelo pastoral incluía a mediação com os governos, a conscientização na sociedade e na Igreja de origem e de chegada dos migrantes, a presença nos portos de partida e de chegada, bem como a presença durante a viagem com capelães de bordo, o cuidado das comunidades migrantes nos locais de chegada e a criação de estruturas capazes de acompanhar migrantes, refugiados e marinheiros durante toda a viagem. Com fidelidade criativa ao carisma e à missão que herdamos de nosso santo Fundador, somos chamados a renovar nosso compromisso missionário eclesial e civil ao mesmo tempo, com base na ideia de que a migração não é apenas um desafio, mas também um “sinal dos tempos” e uma oportunidade de construir fraternidade, justiça e paz em nossas sociedades.

A vida de São João Batista Scalabrini é um evangelho vivido, que ainda nos mostra o caminho da justiça, da compaixão e do acolhimento, que foi reconhecido com sua recente canonização. Seu compromisso de aliviar as feridas materiais e espirituais de tantos irmãos e irmãs forçados a viver longe de sua terra natal, de defender seus direitos, de manter viva sua fé cristã e de sensibilizar as comunidades para uma acolhida aberta e solidária continua até hoje por meio de nossos esforços missionários.

São João Batista Scalabrini, profeta da fraternidade universal, rogai por nós e acompanhai nossa jornada de peregrinos da esperança.

Saiba mais sobre São João Batista Scalabrini, clicando aqui.


Texto: Pe. Leonir Mário Chiarello, CS, Superior Geral da Congregação dos Missionários de São Carlos - Scalabrinianos.

Foto: Arquivo Regional da RNSMM.

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