
Não terminaria nunca, ó diletíssimos, se quisesse enumerar-vos todos os incomensuráveis bens que o Dogma da Imaculada Conceição trouxe à terra. Olhai a serenidade e a tranquilidade da Igreja na luta presente! A guerra a circunda, mas não está dentro dela. A cizânia foi separada do trigo escolhido. Os falsos católicos, tirada a máscara, se manifestaram como realmente são; a Igreja goza, finalmente, daquela paz predita há muitos anos. De fato, a paz mais gloriosa para a Igreja não consiste na ausência das lutas às quais a enviava seu Divino Esposo e daí intitular-se militante, mas consiste principalmente em conservar-se depositária da verdade e da justiça contra os mil adversários que a circundam. Consiste, na comunhão de ideias e no conhecimento do verdadeiro fundamento no íntimo acordo, com a primeira de todas as autoridades. E esta paz, não obstante as humanas vicissitudes, não foi alcançada? Sim, a Igreja goza, agora a paz verdadeira, espiritual, eterna, que os Anjos anunciaram ao mundo, no nascimento de Cristo e que Cristo mesmo deixou em herança a seus discípulos. Finalmente, aquela paz que é o estabelecimento e a dilatação do Reino de Deus, em meio aos homens. (...)
Desafio encontrar-se outra época, na qual a proteção de Maria apareça tão evidente e sensível, como em nossa época e a paz interna da Igreja fosse tão grande como aparece, definida a Sua Imaculada Conceição. Na gruta de Lourdes, não foi para Ela mesma, a grande Virgem, de sua própria boca e de modo mais incontestável, confirmada a mais excelsa herança do Ministério Pontifical, a Infalibilidade, com as palavras: Eu sou a Imaculada Conceição? Não é porventura, para Ela, que tantos pobres iludidos abrem agora os olhos à verdade e as flores mais perfumadas e coloridas, dos áridos campos do protestantismo, vão sendo pouco a pouco transplantadas para os místicos canteiros da única verdadeira Igreja de Jesus Cristo? (...)
Como a Encarnação do Verbo foi a efusão do perdão e do amor de Deus para o mundo, que havia esquecido de tudo, assim Maria Imaculada, diante do Século XIX é a humanidade regenerada, que volta para os braços de Deus.
Maria Imaculada, diante do Século XIX é a falange encantadora das mais escolhidas virtudes, que, com o aparecimento do Salvador, estende-se sobre a face da terra a tomar posse, exatamente na hora, em que todos os vícios a inundam.
É a humildade que derruba o orgulho, é a caridade que suplanta o egoísmo, é a pureza que defende a inocência atacada.
Maria Imaculada diante do Século XIX é a vitória completa do espírito sobre a carne, é a emancipação do pecado, da humilhação, da escravidão, a proclamação da dignidade, da nobreza, da grandeza da natureza humana.
Maria Imaculada, diante do Século XIX é o mais doce conforto dos pobres e dos aflitos. De fato, Ela era inocente, por isso não estava sujeita às penas devida à culpa, todavia experimentou a pobreza, as humilhações, as dores mais cruéis, até se tornar Rainha dos mártires.
Maria Imaculada, diante do Século XIX é salutar lembrança para os ricos a não colocarem o afeto nos bens da terra, mas nos do céu e a exercerem, para com os pobrezinhos de Jesus Cristo, as obras da caridade cristã. Ela, embora Mãe de um Deus e amada por Ele mais do que todas as criaturas juntas, não foi revestida de outras riquezas, senão as do céu!
Maria Imaculada, diante do Século XIX estimula os justos a darem grande importância à graça e os pecadores a deixarem o pecado.
Maria Imaculada, diante do Século XIX é finalmente o íris da paz, chamada entre as discórdias das famílias, entre os tumultos dos funestos acontecimentos, entre o medo e as ameaças dos mais terríveis perigos.
Deificando a razão humana, o nosso século proclama que o homem nunca teve necessidade de Redenção, porque nunca caiu e recusa confessar a desordem que interiormente o degrada e rejeita os sacrossantos dogmas da nossa santíssima Religião e os seus divinos mistérios. Portanto, Jesus Cristo não é, para o nosso século, o piedoso Salvador que, com seu sangue, redime o céu e a terra, mas antes, é o grande filósofo, a quem foram atribuídos caracteres da Divindade. A terra, para nosso século não é o caminho para a felicidade, mas é o paraíso da felicidade; a matéria não é escada para melhor subir no conhecimento de Deus, mas é o fim de suas esperanças. Sua única ocupação é a de subjugar a matéria, de transformá-la, de não ver nada, não esperar nada, de nada admitir além da matéria. Enquanto, com o telégrafo e com o vapor as distâncias do mundo da natureza sempre mais se aproximam, as do mundo da graça, sempre mais se distanciam. Enquanto a luz elétrica ilumina vagamente a escuridão da noite, a suavíssima luz da fé descamba sobre a sociedade civil.
Portanto, ó diletíssimos, quem sanará esta chaga horrenda do nosso infeliz século? Quem reconduzirá este filho pródigo à casa de seu Pai? A piedosa Medianeira de paz e de perdão entre a natureza e a graça, entre Deus e o século XIX; será Aquela que é o milagre mais belo da natureza, a obra mais perfeita da graça, Aquela em cuja pessoa a natureza e a graça, o natural e o sobrenatural, a ciência e a fé se unem e se entrelaçam em sumo grau, de modo estupendo. Aquela enfim, única, que se pode dizer Imaculada (...).
A definição dogmática da Imaculada é a condenação mais decisiva da incredulidade moderna; é a afirmação mais solene da ordem sobrenatural e de todos os valores que se lhes referem.
Não se pode acreditar, Maria concebida imune do pecado original, sem professar o dogma da Criação, da Redenção, da Santificação, sendo o mesmo que confessar ter o divino Pai criado a alma de Maria em estado perfeito; tê-la o Verbo divino resgatado de modo totalmente distinto de todos os filhos de Adão; tê-la o Espírito Santo adornada, com seus dons mais excelsos.
Não se pode acreditar que Maria tenha sido concebida imune de toda culpa original, sem engrandecer a Bondade divina, que a separou da massa corrupta de todo o gênero humano; a sabedoria divina que a elegeu segunda Eva, para reparar os danos causados pela primeira, a toda a natureza humana; o Poder divino, que venceu, de modo glorioso, a Lúcifer.
Não se pode acreditar Maria preservada imune do pecado original, sem professar a plena liberdade de Deus sobre tudo o que existe fora d’Ele e seu absoluto domínio sobre a natureza, sem tributar submissão à sua infinita Santidade, como a inimiga irreconciliável de todo pecado.
Finalmente, não se pode acreditar Maria preservada, imune da primeira falta, sem professar submissão plena da inteligência e do coração, à Igreja Católica, que tal nos propõe a crer.
Nosso século teve vários nomes. Uns o chamaram o século das luzes e do progresso, outros o século do telégrafo e do vapor. Estes, o chamaram o século das ciências químicas e matemáticas; aqueles, o século das discussões e da liberdade. Nós o chamaremos o século da Imaculada! Sim, os outros nomes poderão ser um dia contestados, poderão cair no esquecimento, este nunca. E certo, ó diletíssimos, em que século, mais que no nosso, foi ou poderá ser tão universal, tão vivo, tão apaixonado, o afeto para com a Imaculada Mãe de Deus?
(Texto extraído de Uma Voz Atual, pp.72-75).
Piacenza, 1879.